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Sem Flash
Há algumas semanas fui obrigado a esperar por uma ou duas horas os meus filhos que saíam de uma apresentação de fim de curso, num banquinho, num corredor da UNIRio, na URCA.
Estava com uma máquina fotográfica que comprei há uns 5 anos.
Não consegui usá-la durante a apresentação porque as baterias estavam “fracas” demais para conseguirem acionar o flash.
Era quase noite.
Aguardando, comecei a tentar tirar fotos sem flash dos objetos que estavam a minha volta.
Depois de muitos minutos alterando as configurações da máquina, descobri que conseguia fazer fotos ótimas do mundo (sem muito movimento) que estava no meu entorno, mesmo sem flash.
Mais alguns minutos, descobri como fazer fotos, com pouca luz, que ficaram melhores do que as que eu costumava tirar com flash!
Caramba!
Eu tinha a máquina há 5 anos e nunca havia conseguido uma hora sequer para aprender como usá-la plenamente!
E, uns 10 dias depois, ainda acabei comprando outra, “melhor” do que ela!
Não me sinto muito à vontade desejando a meus amigos o sonho comum dos plebeus, que é “SER REI”...
Riqueza, criados, comida e bebida sem restrição de quantidade ou qualidade.
Casas amplas com jardins únicos, sala de cinema, banheiros luxuosos, roupa de cama trocada a todo instante, cheirosa, tecidos finos e sedutores.
Desfrutar dos paraísos mais distantes, escondidos, intocados.
O carro, o avião, a lancha e o descompromisso com a hora de retornar.
Festas, pessoas felizes, saudáveis e lindas, leais e dispostas a dar alegremente sua própria vida por você.
O problema é que não acredito num mundo de reis e princesas, fadas madrinhas, cavaleiros imortais, homens gorduchos com roupas vermelhas planando em charretes puxadas por animais que não lembro de ter encontrado no zoológico.
Incomoda-me muito o fato dos séculos passarem e continuarmos desejando ser reis.
Se ganhamos R$500,00 sonhamos em ganhar R$5.000,00.
Mas quando ganhamos R$5.000,00 sonhamos em ganhar R$50.000,00.
E, em qualquer caso, sempre sonhamos com os R$200.000.000,00 da Mega-Sena (inclusive eu!).
Quando ganhamos R$50.000,00, aqueles que ganham 10, 100 vezes menos ficam, misteriosamente, longe demais do nosso campo de visão e perdem seus nomes na nossa história.
Os anseios são roteados freneticamente para o novo patamar de R$500.000,00,e a alucinação parece não ter fim.
Portanto, vou lhe desejar o que eu desejo a mim todos os dias.
Que consigamos começar a conhecer plenamente a velha máquina fotográfica, os nossos olhos, as nossas mãos, a nossa mente, os nossos sentimentos, os nossos sonhos e o mundo que estamos continuamente criando e recriando dentro e fora de nós mesmos.
Até porque, por mais estranho que possa parecer, o que há de mais importante, prazeroso e problemático em nossas vidas (pais, filhos, amigos, nós mesmos), não dá para trocar, em 12 vezes sem juros, numa liquidação nas Casas Bahia.
Que sejamos capazes de viver cada vez melhor com cada vez menos.
(Mesmo sabendo alguns me odiarão por conta disso.)
Vou deixá-los com a poesia (Desenredo) de Caymi e Paulo César Pinheiro (ao som – que não posso anexar a esta mensagem por razões autorais e capitalistas - da "princesa" Roberta Sá e dos "magos" do Boca Livre). Esta música serviu de pano de fundo para que eu pudesse escrever este último (talvez o único) suspiro de 2010.
Por toda terra que passo me espanta tudo que vejo
A morte tece seu fio de vida feita ao avesso
O olhar que prende anda solto
O olhar que solta anda preso
Mas quando eu chego eu me enredo
Nas tranças do teu desejo
O mundo todo marcado à ferro, fogo e desprezo
A vida é o fio do tempo, a morte o fim do novelo
O olhar que assusta anda morto
O olhar que avisa anda aceso
Mas quando eu chego eu me perco
Nas tramas do teu segredo
Ê Minas, ê Minas, é hora de partir, eu vou
Vou-me embora pra bem longe
A cera da vela queimando, o homem fazendo seu preço
A morte que a vida anda armando, a vida que a morte anda tendo
O olhar mais fraco anda afoito
O olhar mais forte, indefeso
Mas quando eu chego eu me enrosco
Nas cordas do seu cabelo
Ê Minas, ê Minas, é hora de partir, eu vou
Vou-me embora pra bem longe...